terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

5ª SÉRIE – UMA QUESTÃO ESCOLAR: O DRAMA DA TRANSIÇÃO


Elza de Souza Tomita
Maria da Gloria dos Santos





De acordo com a teoria freudiana, o individuo, por volta dos 11 anos, encontra-se saindo do período de latência e iniciando o desabrochar da sexualidade própria dessa fase:
O período de latência: na teoria freudiana, o período que vai do fim da fase edipiana em torno de 6 anos até o início da puberdade e o começo da sexualidade genital. Freud considertou este como um período relativamente calmo do desenvolvimento infantil. (Stratton e Hayes, 1993, p.174)
Um dado marcante neste momento de vida do jovem é que passa a ter uma vida escolar mais complexa, com muitas matérias de estudo, professores de ambos os sexos e múltiplos contatos com meninos e meninas. Ele esta numa boa fase de desenvolvimento cognitivo, de linguagem e social e se interessando muito pelo mundo dos adultos.
Essa descentralização que acontece na pré-adolescência tem a função de liberar o pensamento infantil do concreto e imediato e direcioná-lo para o abstrato e o futuro, ou seja, transformando o pensamento em instrumento cientifico.
Enfim, o jovem quintanista é um ser em transformações, suas referencias necessitam de novas estruturações. Ele perdeu a referencia familiar e encontra-se mais voltado para os aspectos sociais e dos grupos de amigos.
Neste momento, percebemos que se estabelece um impasse. O adolescente perde nas referencia infantis, esta desestruturando e necessita que a escola supra esta lacuna. Mas, como ser referência para o aluno quando a própria escola encontra-se perdida quanto a seu papel e sua função?
O tempo de meninice, tempo de descobertas e de prazer no aprender, e apreender a si e ao mundo, como o equilíbrio – andar de bicicleta, ou a dor de cair e a alegria de se levantar. Nesta fase, mesmo a escola pode ser mais uma experiência de ampliação de horizontes, aprender a ler e a escrever, a se relacionar com um mundo mais amplo e conhecer novas pessoas.
O relacionamento dos pequenos sob a supervisão de um adulto, geralmente uma professora, vai acontecendo de modo mais suave, devido em parte à fragilidade dos pequenos que torna a mestra mais “maternal”, mais acolhedora. Até a 4a série a criança, de certo modo, está mais protegida, por uma estrutura que corresponde mais ás suas vivências de até então.
Neste momento, o jovem – não mais é visto como criança – perde, principalmente na questão do apego ao professor. Os vínculos, que se estabeleciam a cada ano, às vezes mais de amor em outras mais de ódio, ligavam-nos necessariamente à figura de um mestre. Agora são vários, um para cada matéria, sem contar as freqüentes trocas no decorrer do ano letivo. Qual a mensagem que está sendo passada a esse aprendiz?
Que deste momento em diante ele se tornou parte em uma grande engrenagem, que vai além de sua capacidade de compreensão. E, que os laços afetivos devem ser deixados em segundo plano, pois, o que contará a partir de então será o desempenho intelectual.
Estabelece-se um corte entre o eu pensante e o eu que sente. Padrão na sociedade, que prega que não se deve levar problema de casa para o trabalho ou escola e vice-versa, como se as pessoas fossem compartimentadas e pudessem se dividir se cindir em dois ou mais. Essa ruptura é entendida pela teoria do apego como algo nocivo à estrutura da pessoa, visto que o apego pressupõe: uma propensão do ser humano para formar fortes vínculos afetivos com outros seres humanos; as várias formas de perturbação emocional que ocorrem quando esses vínculos são ameaçados ou rompidos; a construção ao longo da infância de modelos mentais de si próprio, do outro e da possibilidade de relacionamento interpessoal; e, maneira como esses modelos se tornam componentes centrais da personalidade, regulando a percepção, o sentimento e o comportamento do ser humano.(Castilho, 1994. p. 44).
Comportamento este, em estreita ligação com regras da escola que visam o controle do corpo – não sair da sala de aula para ir ao banheiro ou tomar água fora dos horários determinados, apenas em algumas aulas. Não se leva em conta a situação desconfortável de calor ou alguma necessidade do aluno, ele tem de aprender a se controlar. Tudo, enfim, girando em torno do controle, o professor controla o aluno, a escola controla o professor e esta é controlada por outras instâncias do poder público e é assim desde sempre.
Assim, resta ao aluno ignorar as emoções, controlar o corpo e se dedicar com afinco à esfera mental e assimilar conteúdos neutros, científicos e que por isso mesmo são destituídos de significado para ele. Qual a saída? Atribuir valor/nota, investir o professor de autoridade/ domínio de sala, ter à mão um sistema de punições que vai da suspensão à reprovação, “prender” o aluno pelo medo e não pelo afeto?
Apesar de todo conhecimento que se tem sobre aprendizagem, desenvolvimento, motivação, de tudo que já se estudou sobre o afeto e a afetividade, a escola segue com um modelo que mais lembra o período medieval, com noções dogmáticas subjacentes a um discurso de modernidade, que tem em suas entranhas um modelo de educação ainda rígido e cerceador.
Poderíamos neste ponto propor: faça-se assim... A escola poderia destinar um professor responsável por cada turma de 5º série. Este trabalharia um número maior de disciplinas ficando com menos turmas, tendo, assim, mais tempo e disponibilidade para acompanhar com proximidade aqueles alunos sob sua responsabilidade. Esse professor manteria um vínculo mais forte com os alunos, facilitando o entrosamento com os demais professores, ou seja, far-se-ia uma passagem mais suave e menos frustrante no mundo dos adultos. Um vínculo de apego seguro poderia sanar grande parte dos problemas de comportamento em sala de aula desses adolescentes.
Talvez essa pudesse ser uma solução, mas não queremos dar que seria mais uma em meio a tantas. Não pretendemos apresentar uma solução, apenas nos colocar no nosso papel de educadores que refletem sobre a educação e nessas reflexões alguns caminhos podem se delinear.
Pois... quando olho para alguém não posso olhá-lo como se fosse plano, tenho de vê-lo com toda a complexidade. E quando me junto a outros para discutir, procuro saber se eles têm a mesma mirada que eu. E assim se organizam as escola”. (Castilho, 1994. p.15)
Assim, entendemos que organização por parte das escolas e o sentimento e a emoção de todos os envolvidos na transição da 4ª para a 5ª série, numa atitude de contínua observação e reflexão, pode minimizar as dificuldades dessa fase. Não fazer do ensinar um ato mecânico, mas um processo de reflexão constante.

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