quarta-feira, 11 de novembro de 2009

FAMÍLIA E ESCOLA: mundos diferentes que se complementam

Alexandro Muhlstedt

INTRODUÇÃO

Assim como toda a sociedade, família e escola sofreram, ao longo dos anos, profundas mudanças em sua estrutura. Essas mudanças fizeram alterar ao longo dos anos os papeis da escola e da família. A escola deixou de ser unicamente responsável pelo repasse de conhecimentos para se tornar educadora, desempenhando ao lado dos pais a função de fornecer também uma boa formação integral. Por isso, cabe refletir sobre essas duas instituições e como organizar uma relação dialógica entre ambas.

Família e escola

Etimologicamente, "família" é o conjunto dos famuli, ou seja, dos criados, servos e domésticos, na civilização romana (e, de certa maneira, entre os gregos). Só mais tarde, "família" abrangeu mulheres e filhos. Os laços de sangue agrupavam as pessoas na gens, de genere, "gerar". Segundo o dicionário de Houaiss, o vocábulo “família” pode significar, num sentido mais restrito “grupo social básico, formado por pai, mãe e filhos”, num sentido mais abrangente “pessoas ligadas entre si pelo casamento ou qualquer parentesco”, e ainda num sentido geral “grupo de seres ou coisas com características comuns”.
Já a palavra escola tem sua origem mais próxima no latim clássico schola, que por sua vez originou-se do grego skhole, que significava 'lugar do ócio'. Uma escola é, então, qualquer estabelecimento ou instituição de educação. Essa ideia surgiu da filosofia dos gregos antigos, onde eles se reuniam em praças públicas para praticar filosofia e trocar conhecimentos. Escola pode se referir a uma instituição de ensino ou a uma corrente de pensamento com características padronizadas que formam certas áreas do conhecimento e da produção humana.
Faz-se necessário situar as palavras “família” e “escola” a partir de sua origem, para compreender o processo que vem ocorrendo no contexto educacional. Como mencionado anteriormente, é uma necessidade do mundo contemporâneo que ocorra a aproximação desses mundos tão distintos, mas que se aproximam e se complementam quando se trata de educação escolar.

A relação entre a escola e a família

Na literatura antropológica e sociológica a definição de família não se restringe ao grupo domiciliar, pois os laços de família extrapolam o domicílio, a cidade e até o país. Nessa perspectiva de estudo, uma família engloba pessoas com diferentes graus de parentesco, definidos a partir da descendência / ascendência sanguínea, ou através do casamento e da adoção. A família é unida por múltiplos laços capazes de manter os membros moralmente, materialmente e reciprocamente durante uma vida e durante as gerações.
As famílias como agregações sociais, ao longo dos tempos, assumem ou renunciam funções de proteção e socialização dos seus membros, como resposta às necessidades da sociedade pertencente. Nesta perspectiva, pode-se compreender que as funções da família regem-se por dois objetivos, sendo um de nível interno, como a proteção psicossocial dos membros, e o outro de nível externo, como a acomodação a uma cultura e sua transmissão. A família deve então, responder às mudanças externas e internas de modo a atender às novas circunstâncias sem, no entanto, perder a continuidade, proporcionando sempre um esquema de referência para os seus membros (MINUCHIN, 1990). Existe, consequentemente, uma dupla responsabilidade, isto é, a de dar resposta às necessidades quer dos seus membros, quer da sociedade (STANHOPE, 1999).
Atualmente, a família tem passado para a escola a responsabilidade de instruir e educar seus filhos (COSTA, 2000) e espera que os professores transmitam valores morais, princípios éticos e padrões de comportamento, desde boas maneiras até hábitos de higiene pessoal. Justificam alegando que trabalham cada vez mais, não dispondo de tempo para cuidar dos filhos. Além disso, acreditam que educar em sentido amplo é função da escola. E, contraditoriamente, as famílias, sobretudo as desprivilegiadas, não valorizam a escola e o estudo, que antigamente era visto como um meio de ascensão social (DI SANTO, 2005).
A escola, por sua vez, afirma que o êxito do processo educacional depende, e muito, da atuação e participação da família, que deve estar atenta a todos os aspectos do desenvolvimento do educando. Reclama bastante da responsabilidade pela formação ampla dos alunos que os pais transferiram para ela, e alega que isto a desviou da função precípua de transmitir os conteúdos curriculares, sobretudo de natureza cognitiva. Com isso, ao invés de ter as famílias como aliadas, acaba afastando-as ainda mais do ambiente escolar.


Ações para aproximação escola e família

Diante de todo esse processo é que ações foram definidas para serem incorporadas ao cotidiano do Colégio Estadual Professor Francisco Zardo, de Curitiba – Paraná, para efetivar a aproximação da escola e da família, consolidando princípios para que a família compreenda melhor o que se passa na escola.
Organizou-se, então, um cronograma de encontros com os pais, a fim de que conhecessem os processos pedagógicos aos quais seus filhos – alunos da escola – estão submetidos. O princípio, nesse caso, é que, somente quando a família conhece o que ocorre na escola, poderá se dispor a colaborar. Entende-se que, quando a família conhece, ela acredita e contribui positivamente para aquilo que ocorre no cotidiano escolar de seus filhos.
Após definir as reuniões com as famílias, foram organizadas as ões que devem ocorrer ao longo do ano, uma vez que os pais comparecessem. Ficaram assim definidas:
  1. Encaminhamento de Comunicado escrito (informando dia, horário, local e assuntos a serem tratados) por meio de alunos. Tal comunicado deve retornar com a assinatura da família, inclusive explicando, no caso de não comparecer, os motivos da ausência.
  2. Conferir durante toda a semana, por meio de assinatura dos alunos, o retorno dos comunicados. Garantir que todos os alunos devolvam o protocolo com assinatura da família.
  3. Levantamento de dados constando a quantidade de comunicados que retornaram, quantos pais comparecerão e quantos não virão e por quais motivos.
  4. Definição de pauta comum e organização das salas aonde os pais serão recepcionados, sendo que a reunião serão conduzida pelos professores. Antes, porém, na quadra da escola, por 15 minutos, a Diretora geral dará as boas vindas e reforçará a importância da participação da família na vida escolar, bem como solicitar a adesão dos pais para auxiliar na melhoria do espaço escolar.
  5. A pauta é composta por assuntos gerais, priorizando aqueles que explicam o funcionamento da escola: as regras gerais, o sistema de avaliação, a metodologia, as atividades previstas, etc. Evita-se “dar bronca” nos pais, fazer “jogo de culpa”, expor alunos, insistir no que ocorre de negativo.
  6. Solicitar sugestões e opiniões dos pais, anotando o que for dito.
  7. A realização, na sequência, do encontro dos professores e pedagogos tem como objetivo socializar e organizar as “falas” dos pais”. A partir daí, se estabelece o termômetro de pontos de vistas, opiniões e olhares dados pelas famílias àquilo que seus filhos estão vivenciando.
  8. Implementação de questionário ao pais, perguntando sobre ensino, aprendizagem, educação e comportamento.
  9. Tabulação dos dados e elaboração de gráficos a partir das respostas dos pais.
  10. Reuniões para orientar sobre matrícula, Estatuto da Criança e do Adolescente - artigo 53.
  11. Encontro, no turno da noite, para orientações sobre Estatuto da Criança e do Adolescente – artigo 129, atividades de último bimestre e entrega de boletins.
  12. Aproximações e relacionamento com os pais em todos os momentos da escola, comunicando-se por meio de telefonemas. Por isso, a organização de lista com números de telefones para comunicação com a família.
  13. Encontros com estagiários de Psicologia para orientar os pais e propor ações para melhor conhecer seus filhos e como atuar eficazmente na educação.

Na relação da escola com a família, um sujeito sempre espera algo do outro. E para que isto de fato ocorra é preciso que se desenvolva a capacidade de construir de modo coletivo uma relação de diálogo, onde cada parte envolvida tenha o seu momento de fala, onde exista uma efetiva troca de saberes e a efetivação de compromissos. A construção dessa relação implica em uma capacidade de comunicação que exige a compreensão da mensagem que o outro quer transmitir, e para tanto, se faz necessário a competência e o desejo de escutar o que está sendo expresso, bem como a flexibilidade para apreender ideias e valores que podem até ser diferentes, e muitas vezes, divergentes. Por parte da escola deve ocorrer o respeito pelos conhecimentos e valores que as famílias possuem, evitando qualquer tipo de preconceito e favorecendo a participação dos componentes da instituição familiar em diferentes oportunidades, estimulando o diálogo com os pais e possibilitando-lhes, também, obter um ganho enquanto sujeitos interessados em evoluir e se aperfeiçoar como seres humanos e cidadãos compromissados com a transformação da realidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É imprescindível reconhecer que a parceria entre a escola e a família mostra-se multifacetada, intensamente carente de discussões e melhorias adequadas ao seu desenvolvimento. A relação escola e família, tão discutida por pesquisadores, depende exclusivamente do compromisso dos envolvidos no processo educacional, ou seja os profissionais da escola e os membros da família do aluno. Tal relação emerge um tal tipo de interação que possibilita que ambas conheçam suas realidades.
Como assevera Dessen e Polonia (2007, p. 29) a família e a escola constituem os dois principais ambientes de desenvolvimento humano nas sociedades ocidentais contemporâneas. Assim, é fundamental que sejam implementadas ações no âmbito escolar que concretizem a aproximação entre os dois contextos, de maneira a reconhecer suas peculiaridades e também similaridades, sobretudo no tocante aos processos de desenvolvimento e aprendizagem, não só em relação ao aluno, mas também a todas as pessoas envolvidas. Afinal, essa unidade dialógica e de ações é necessária, vislumbrando um ensino e uma aprendizagem adequados, éticos e significativos.
É primordial, então, repensar a relação entre essas as duas instituições, promovendo mudanças significativas, o que não se mostra ser uma tarefa fácil, pois existem inúmeros mecanismos de exclusão que rechaçam não somente as vontades e os desejos de mudanças, como os pais que não valorizam a interação com as escolas de seus filhos ou a escola que mantendo o tradicionalismo impedem uma maior aproximação entre elas.
A iniciativa que vem ocorrendo no Colégio Zardo almeja romper com ideias cristalizadas de que escola e família é uma relação complicada. Deseja um trabalho de mão dupla, em constante diálogo, em prol das melhorias do ensino e da aprendizagem e, consequentemente, por uma formação verdadeiramente humana.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ACKERMAN, H. Diagnóstico e tratamento das relações familiares. Porto Alegre: Artes Médicas,1980
DI SANTO, J. M. R. Família, escola e suas responsabilidades. [S.l.:s.n.]. Disponível em: <http://www.webartigos.com/articles/7514/1/a-familia-na-atualidade/pagina1.html>. Acesso em: 02 dez. 2008.
COSTA, A. C. G. da. A relação família / escola. [S.l.:s.n.]. Disponível em: <http://www.educacaoetecnologia.org.br/escolaconectada/?p=180> Acesso em: 09 maio. 2008.
COLÉGIO ZARDO. Projeto Político Pedagógico. Curitiba. 2009.
DESSEN, M. A.; POLONIA, A. C. A família e a escola como contextos de desenvolvimento humano. In: Paidéia, Brasília, 2007, p. 21-32.
HOUAISS, A. e VILLAR, M. S. Dicionário eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro, Objetiva, 2001.
MARQUES, R. A escola e os pais: como colaborar? 4 ed. São Paulo: Texto Editora, 1993.
MINUCHIN, S. Famílias: funcionamento & tratamento. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990. p. 25-69.
STANHOPE, M. Teorias e desenvolvimento familiar. In STANHOPE, M.; LANCASTER, J. Enfermagem Comunitária: Promoção de Saúde de Grupos, Famílias e Indivíduos. 1.ª ed. Lisboa: Lusociência, 1999. p. 492-514.


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